segunda-feira, maio 31, 2004

Para proteger a indústria local, atrasam estreias estrangeiras

China abre guerra a Hollywood


Foi prejudicada a chegada aos cinemas de "Shrek 2", "Harry Potter" e "Homem-Aranha 2", entre outros filmes; Aplicam-se quotas à importação de películas norte-americanas

A China decidiu atrasar a estreia de películas procedentes de Hollywood para proteger a sua decaída indústria nacional. Além disso, pela primeira vez, aplicará quotas para reduzir a importação de películas norte-americanas. «Não se trata duma proibição, mas de coordenar a distribuição dos filmes», assinalou um porta-voz do China Film Group (juntamente com a Huaxia Corporation, as únicas com alvará de distribuição de películas estrangeiras no país). Assim, filmes de sucesso em todo o mundo, como "Homem-Aranha 2 / Spiderman 2", "Harry Potter" ou o segundo episódio da película de animação "Shrek", verão ser atrasada a sua data de estreia em sete semanas. Estes atrasos coincidirão com o início da temporada de Verão. «Quando os jovens chineses começam as férias, pelo que temos feito todos os preparativos para que os filmes produzidas na China sejam estreados em Junho e Julho», acrescentou o porta-voz. Esta medida, que apanhou de surpresa as autoridades norte-americanas, continua a linha marcada pelas autoridades culturais francesas, política que se conhece habitualmente como "excepção cultural".

Não há discriminação, garantem autoridades

A imparável irrupção das produções de Hollywood que acompanhou a entrada de Pequim na Organização Mundial do Comércio (OMC), colocou a indústria cinematográfica chinesa numa situação financeira insustentável. É que, apesar das reconhecidas originalidade e qualidade artística das produções chinesas, os espectadores mais jovens inclinam-se agora pelas "divertidas" fitas hollywoodianas. Paradoxalmente, o cinema chinês foi uma das maiores atracções da última edição do Festival de Cannes, com a presença dos cineastas Zhang Yimou e Wong Kar-wai, enquanto a actriz Maggie Cheung foi distinguida com o Prémio de Melhor Intérprete.
A China importou no ano passado vinte películas, das quais dezoito eram norte-americanas, uma sul-coreana e outra produzida e protagonizada por Jackie Chan, estrela das artes marciais proveniente de Hong Kong. A Administração Estatal de Rádio, Cinema e Televisão pretende reduzir esta quantidade para catorze. Mas frisa que estas medidas não têm carácter discriminatório, já que apenas pretendem incrementar a variedade do cinema do exterior com a aquisição de mais películas europeias e asiáticas.
Por outro lado, as autoridades chinesas já advertiram as produtoras e distribuidoras norte-americanas que poderá haver outra demora do género durante as celebrações do quinquagésimo quinto aniversário da Fundação da República Popular Chinesa, ocorrida no 1º de Outubro de 1949. Além de fazer a Festa Nacional, o Partido Comunista propõe-se comemorar este ano o centenário do nascimento de Deng Xiao-ping, considerado o artífice da reforma e abertura da China.
A presente medida provocará uma significativa redução na vendas de bilhetes, mas os especialistas advertem que esta medida poderá minorar também os investimentos estrangeiros no pujante cinema chinês. Um dos factores que está a por em xeque o cinema local - mas que também afecta as películas estrangeiras -, são as cópias ilegais em DVD, cujo preço nas ruas é, aproximadamente, de um dólar. Uma cópia ilegal pode sair para o mercado negro antes mesmo que um filme local chegue às salas de cinema, e apenas uma semana depois que uma película de Hollywood seja estreada nos Estados Unidos.
Como arranque desta nova política cinematográfica, o Festival de Cinema de Shanghai, que começa no próximo sábado, não terá este ano, pela primeira vez na sua história, nenhuma produção de Hollywood. A secção oficial será dominada pelo cinema asiático e europeu. Contudo, embora o ciclo de cinema francês celebrado no passado mês de Abril se tenha revelado um grande êxito de público, as produções norte-americanas atraem a maioria dos espectadores, como é o caso de "O Regresso do Rei", que facturou nos seus três primeiros dias de exibição 3,4 milhões de dólares. O mesmo organismo estatal tornou pública recentemente uma série de políticas dirigidas a reduzir as cenas de sexo e violência nos filmes, séries de televisão e desenhos animados, com o objectivo manifesto de "reforçar a moral dos jovens".